segunda-feira, junho 22, 2009

Olha ela ali, toda sorridente.
Ela sempre manteve o sorriso no rosto quando ele aparecia para vê-la.
Como se fosse uma boneca na caixa, ela sempre sorria na esperança de que ele a escolhesse. Algumas vezes ele passava por ela, parava e ficava olhando. E ela tinha vontade de chorar. Chorar de esperança de que, finalmente, ele a levasse embora. Por que ela está chorando? Mas ele só olhava, passava a mão na caixa, mas acabava por pegar a boneca ao lado. E ela continuava ali, sorrindo, mas chorando. Por que é que ele nunca me escolhe?
E então vinham outras pessoas que também a olhavam, alguns até acabavam por levá-la, mas ela acabava voltando sozinha para a caixa ou, ainda, era levada de volta. E ela sempre voltava com algum arranhão. Nunca voltava ilesa. No fundo, ela queria que quem a levasse, com caixa e tudo, fosse ele. Mesmo que a maior ferida tenha sido causada pela indiferença dele.
E ele sempre voltava para vê-la, de alguma forma. Mas nunca a segurou por muito tempo. Então por que ele a olhava?
Ah, boneca...
E então ela se cansou de não ser escolhida e resolveu se esconder. Escondeu o rosto com as mãos e ele não viu mais o sorriso dela. E ela, que sempre esteve tão disponível para ele, resolveu que talvez ela mesma devesse sair daquela caixa e andar com as próprias pernas. E ela saiu da caixa e se machucou mais. Machucou as mãos na hora de rasgar aquele papelão todo. O plástico duro cortou seu rosto.
E ela descobriu que tinha esquecido como andar. E caiu muitos tombos até chegar ao seu destino. E ela chegou toda machucada, sangrando, até ele.
Por favor, me diz, por que é que você só me olha e não me escolhe?
Porque eu não quero te machucar mais.

Um comentário:

Unknown disse...

Ele sempre a viu na prateleira, sabia que ela era única, igual a ela, nunca em sua vida ele tinha colocado os olhos sobre.
O medo de quebrar e não saber usar, de não saber dar o valor, de fazer valer aquela escolha, ele nunca a pegou da prateleira, por um único e simples motivo, o medo.
Pode parecer fútil para alguns, imbecil para os outros, mas para ele, o simples medo de não saber lidar com ela, conviver com ela, cuidar dela para que ela não se machuque ou não arranhe o rosto, era o que o afastava de poder escolher por ela na prateleira e a levar para a sua casa e ser feliz com ela.
Esse medo sempre o fez empurrar a caixa ela para o final da prateleira, com a idéia de que ele não a veria mais e assim esquecesse o quanto ele se sentia especial cada vez que ele passava por aquela loja e olhava para aquela caixa, que de pequena não tinha nada, pois ela sempre foi maior do que todas, sempre foi melhor do que todas.
Até hoje ele não sabe o que fazer com o medo, e enquanto isso, ele namora a caixa na prateleira, muitas vezes à distância pra que não corra o risco de fazer ela tentar sair da caixa e mostrar pra ele que ele não precisa ter esse medo.
E o medo dele agora???
Tá maior ainda, porque ele sabe o que vai acontecer...